Cravo e Canela

quarta-feira, 24 de agosto de 2011

Segredos de uma viúva



Ontem fez 5 meses que ele foi embora, nesse período eu rebobinei tudo que fizemos juntos pela vida e decidi contar uma parte dos momentos finais.


Há momentos na vida de uma pessoa em que a mente entra num estado de torpor, que a alimentação é secundária, em que a consciência do meio ambiente quase desaparece na escuridão. Esse foi o período que fiquei sem saber se ia ou ficava. Eu não sabia se seguia os conselhos do médico de voltar a cuidar da vida ou se ficava ali esperando o instante da morte. Existe o momento em que é tarde demais para palavras, em que eu gritava alto por dentro, eu olhava para ele é pedia socorro sem dizer uma palavra se quer. Isso aparece quando você percebe que é tarde demais para qualquer intervenção, mas também é cedo demais para uma separação final. Foi o momento mais difícil da minha vida. Eu desejei que passasse, que tudo terminasse; mas também queria me agarrar com desespero a minha Fé, pois sabia que estava prestes a perdê-lo para sempre. Foi o momento em que não saía palavras. Eu silenciei. Quando eu cheguei às 11h e olhei o soro correndo rápido os olhos abertos, mas sem movimentação senti que aqueles olhos curados que me olharam na noite anterior eram de despedida. Ele tinha deixado eu escovar seus dentes, passar o creme, arrumar os cachos, passar o perfume e cobri-lo um pouco. E fiquei em silêncio. Mas sabe aquele silêncio que vai além das palavras?... Foi o nosso. O que eu tinha prometido a ele nas nossas conversas no qual o meu falar era respondido com o olhar. Estava acontecendo. Eu sabia que ele era forte e não teria medo de nada e jamais eu o deixaria só. Tinha prometido que faria o possível para dor nenhuma perdurar. Quando ele decidiu partir não foi assustador nem doloroso ele simplesmente fechou os olhos. Foi um cessar em paz do funcionamento do corpo. Eu fiquei observando abraçada, sem alarde. Não gritei, sabe...Porque ele se foi com o que considero de mais precioso em um ser humano. Ele partiu dignamente. No meu intimo eu sabia que ele escultava, tinha sentimento e todo o direito de ser ouvido e assim fazia eu. Tudo até quando ele já não falava nem com as mãos eu perguntava. Eu aprendi a falar por ele e tenho maior orgulho disso, pois nesse tempo de idas e vindas, vi muito paciente sofrer mais emocionalmente do que fisicamente. Sabe por que? As necessidades não mudam o que mudam são apenas as aptidões em satisfazê-las.


Sinto que algumas pessoas não compreendem meu estado hoje e nem naquele dia. Eu chorei de lágrimas nos olhos, mas sorrir por vê-lo do jeito que ele era. E nesses cinco meses eu choro sim e muito, mas o meu choro é aquele da alma sendo rasgada com uma navalha. Sabe que dor é essa? Essa dor remédio nenhum alivia. Sinto dor de injustiça. Sinto dor ao ver um amigo e ter que dizer que não achei bacana vê-lo ainda. Sinto dor pelos meus filhos que passaram o dia dos pais falando dele até o final da noite. Sinto dor por não conseguir resolver as coisas que com ele seriam apenas mandadas e alguém bem ali, faria sem pestanejar. Sinto dor por não ter o direito de ter direito. Sinto dor por ser julgada, mesmos sabendo que eu desejei muito está no lugar dele, acho que nossos filhos ficariam melhor. Sinto dor porque demorei muito e não briguei mais por essa vida. Sinto dor por ter permitido que ele decidisse sozinho e eu acatasse tudo passivamente. Sinto dor de todas as formas, mas meu sorriso me salva. Tenho sequelas físicas e psicológicas que serão eternas. Isso é pouco? Deve ser... Mas nada posso fazer se não tenho tendência a depressão, enclausuramento..Não me maldigo em nada, mas posso contarrrrr... Faço maior esforço para não passar necessidade. E se depender do meu empenho, fome e falta de educação para meus filhos isso jamais faltará, porque sou nova e sem medo de ser feliz e tenho uma certeza aqui dentro do peito que  ainda conseguirei vencer e  repartir para os que precisam.  

2 comentários:

Camila Cruz Sampaio

Amiga, força! Tamo com vc!
Bjs Camis

Vivi

‎"Falam de tudo. Da moral, do comportamento, dos sentimentos, das reações, dos medos, das imperfeições, dos erros, das criancices, ranzinzisses, chatices, mesmices, grandezas, feitos, espantos. Sobretudo falam do comportamento e falam porque supõem saber. Mas não sabem, porque jamais foram capazes de sentir como o outro sente. Se sentissem não falariam."
(Nelson Rodrigues)
Amiga, vc é especial demais! Segura essa onda, que vai dar tudo certo. Um beijo grande e continue linda com esse seu sorriso!